Projeto leva apresentações de música a escolas de Joinville

Iniciativa contemplada pela Lei Aldir Blanc reúne músicos com deficiência visual para resgatar músicas de roda e promover inclusão

A música como refúgio, superação e ferramenta de inclusão. Foi com esse espírito que três músicos com deficiência visual subiram ao palco das salas de aula de escolas municipais de Joinville em outubro. O projeto Novo Olhar, contemplado pela Lei Aldir Blanc, pretende realizar quatro apresentações gratuitas voltadas a alunos do 1º ao 6º ano, combinando canções infantis, danças de roda e histórias de vida que emocionaram e inspiraram.

Com cerca de 45 minutos de duração, as apresentações resgataram músicas tradicionais que atravessaram gerações e aproximaram os estudantes da vivência de pessoas com deficiência visual. Para o coordenador do projeto, Nery Júnior, a proposta uniu cultura, memória e inclusão.

“Queríamos levar às escolas a perspectiva de que a pessoa com deficiência visual é como qualquer outra: conversa, dá risada, tem sentimentos. A inclusão não acontece fazendo por nós, mas fazendo conosco”, destacou.

Histórias que transformam

Entre os músicos estava Jean Pierre, 34 anos, que nasceu com deficiência visual causada por rubéola congênita. Desde a infância, ele encontrou na música um caminho para se inserir socialmente.

“A música é um incentivo muito grande, onde eu me sinto inserido na sociedade. Também é um refúgio maravilhoso para nós”, contou.

Jean já participou de bandas de igreja, dupla sertaneja e apresentações em escolas. O retorno ao ambiente escolar, agora como artista convidado, foi uma oportunidade de inspirar crianças e mostrar que as diferenças podem ser pontes de aprendizado e convivência.

A trajetória de Bruno, 22 anos, também revelou a força da música. Aos 15 anos, ele perdeu a visão em decorrência de um tumor cerebral. O violão e a bateria, que já faziam parte da sua rotina desde os 8 anos, tornaram-se fundamentais no processo de adaptação.

“Voltar a tocar sem a visão foi uma barreira muito grande, mas a música me impulsionou. Foi nela que consegui me sentir parte de um grupo, de uma sociedade. Ela me ajudou a superar a tristeza e a encontrar novos caminhos”, relembrou.

Cultura que conecta gerações

O projeto nasceu de conversas entre os músicos sobre as brincadeiras e canções que marcaram a infância da geração dos anos 1990. Jogos como taco, cabra-cega, pingue-pongue e músicas de roda como Ciranda, Cirandinha e A loja do mestre André serviram de inspiração para levar às escolas atividades que resgatam essa memória cultural.

“As crianças hoje sabem tudo sobre tecnologia, mas muitas vezes desconhecem as músicas e brincadeiras tradicionais. Queríamos resgatar isso e, ao mesmo tempo, propor um momento de interação verdadeira, com dança, música e histórias”, explicou Nery.

As apresentações também tiveram um componente lúdico: os alunos foram convidados a cantar e dançar junto, criando um ambiente de integração e aprendizado.

A realização foi possível à Lei Aldir Blanc, que garantiu recursos para instrumentos, equipamentos e transporte. Para os artistas, trata-se de uma política cultural essencial para democratizar o acesso à arte e fortalecer a produção local.

“Sem essas leis, talvez essas crianças fossem muito mais alienadas à globalização. A cultura viabiliza desde a logística até o registro profissional do trabalho, garantindo que mais pessoas tenham acesso a ele”, afirmou Neri.

Música como legado

Mais do que apresentações, o projeto deixou marcas nas crianças: a valorização da diversidade, a consciência sobre inclusão e o contato com manifestações culturais que resistem ao tempo.

“Nosso objetivo era que os alunos levassem dessa experiência uma lição de empatia e respeito. Mostramos que a deficiência não é uma barreira para viver, criar e ensinar, pelo contrário, é uma oportunidade de enxergar o mundo de uma forma diferente”, concluiu o coordenador.

As apresentações, realizadas em parceria com a Secretaria de Educação de Joinville, aconteceram nas escolas Professora Maria Regina Leal e Doutor Abdon Baptista, nos dias 17 e 21 de outubro. Já no mês de dezembro, outras duas escolas receberão o projeto, ampliando o alcance da iniciativa e levando mais música e inclusão às salas de aula da rede municipal.